quinta-feira, 8 de setembro de 2016

A Terceira Margem do Rio






Toda vez que abro para escrever aqui automaticamente me vem jogar assuntos sérios e pesados, pois uso o blog principalmente para exorcizar meus fantasmas. Ou dar indiretas ácidas, hehe...

Mas não. Chego em casa e me perco entre a pianista que quer arrumar a casa, a cantora que deseja ler Guimarães Rosa e a dona de casa que precisa arrumar o repertório da apresentação de sábado.

Ao invés de tudo isso, sento-me no sofá, laptop no colo, e resolvo ouvir todas as palestras que ainda não ouvi, os debates que não debati, as músicas que não toquei, as ideias que ainda não tive... com um odú incessante nos fones de ouvidos, rebatendo lá no fundo da alma...

Verdade que há quem queira decifrar a esfinge diante de um decifra-me ou devoro-te sutil debaixo de claro riso, letal como o mais discreto invertebrado do Pacífico. Risca terceira, duro silêncio nosso pai.

A liberdade é dom generoso que se derrama de braços continuamente estendidos como chuva fria e adentra aos poros, peregrino sedento, como ave confiante no alimento, como criança alegre que atravessa a rua na mão de estranho. A liberdade é bendita e cobra sua sabedoria, não desperdice a água, o rio riu e ensinou em suas margens empíricas. Tudo está à sua disposição. Beba da fonte. Mergulhe no fundo. Pule no vazio. Caminhe na beirada. Nada evite. Nada descarte. Nada subjugue. Por entre as árvores da vida o rio riu, ri. 

E caminhamos em meio a luz e sombra, certezas e invisíveis flechas cujas pontas trazem curare certeiro, respiração ruidosa consciente, dia após dia, mês após mês enquanto você, você vaga, vagamente se lembrando de quem era e do que queria com todas as forças. Quando não se preocupava em levar o guarda chuva ou tomar o remédio ou perder as chaves. Você andava na beirada com tal desenvoltura e equilíbrio que a margem virava chão firme sob seus pés. E você não sabia. Você apenas ía. Não há caminho errante para quem sabe onde ir.
















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